Nestes
últimos dias assistimos a mais uma prova de que a utopia de um mundo melhor,
mais justo e humano, desintegra-se em meio às raízes podres fincadas no solo
lamacento da nossa vida social e política. O ranço de ignorâncias presente em
figuras poderosas e nações autoritárias remete-nos às idéias do filósofo
iluminista Rousseau, que atestam a corrupção da moralidade humana no momento em
que os homens passaram a viver em sociedade. "Homo homini lupus" (o homem é o
lobo do homem), já proferiu Hobbes certa vez. Contudo, Voltaire não nos deixa
esquecer: foram os homens que corromperam a natureza, pois eles não nasceram
lobos, tornaram-se lobos! Agora pergunto: a nova situação geopolítica mundial,
na qual Coréia do Norte e EUA ameaçam o mundo com uma guerra nuclear, não
celebra a estupidez humana, como já ironizou há tempos o gênio Renato Russo? E
mais, Obama, Berlusconi, Cameron, Kim jong-Un etc, são ou não lobos em pele de lobos?
Os vários exemplos de sandices como
torturas, ameaças, racismos, intolerâncias e genocídios ocorridos no cumulativo
processo histórico não desapareceram e, agora, emergem num vórtice de relações
de poder inconsequentes e egoístas. Se uns entram para a história por seus atos
memoráveis, outros com certeza serão eternizados pelos seus atos deploráveis;
as mazelas enraizadas no imaginário coletivo pelas consequências de suas
tolices habitarão os sonhos mais horrendos de gerações futuras. Como podemos
ainda aceitar tais bizarrices no comando do poder mundial? E pior: o norte-americano,
entrincheirado no seu fundamentalismo “democrático”, ceifa vidas de crianças
mundialmente, quando não pela violência direta, pela violência econômica,
social e cultural, sugando-lhes o fio de vida que ainda resta, ao sepultar-lhes
a esperança de um futuro justo!
Desacreditar nesse futuro é aceitar
que a justiça social é pura utopia. Ledo engano: não apenas a social, como a
econômica, a política e a cultural são possíveis. Não se trata aqui de
ufanismos como o de “ame a humanidade”, pois isto não é uma tarefa árdua. O que
é a humanidade, afinal? É fácil ter compaixão por uma criança angolana que
agoniza de fome ao mesmo tempo em que é devorada por uma ave carniceira. Mas o
que podemos fazer não é mesmo? Ela está tão longe. Mas é claro que todos se
compadecem de seu sofrimento. Como diz uma frase de Henry Fonda, e que deveria
incomodar a todos, “É fácil amar a humanidade; difícil é amar o próximo”.
Se a humanidade quer ter um futuro
reconhecível, não pode ser pelo prolongamento do passado ou do presente. Se
tentarmos construir o terceiro milênio nestas bases, vamos fracassar, e o preço
do fracasso será a escuridão! Neste momento lembro-me de um lindo discurso de
Martin Luther King, levado a cabo em 1963, que apesar de tratar do racismo,
poderia ser pensado em todas as esferas citadas, e que dizia mais ou menos o
seguinte: “Eu tenho um sonho. O sonho de que um dia o homem não seja julgado
pela cor de sua pele, mas pela nobreza de seu caráter...”. Nem por sua opção
sexual, religiosa ou política... Quimeras... (?!)